segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas - Miastenia Gravis 2/6

Portaria SAS/MS no 229, de 10 de maio de 2010. (Retificada em 27.08.10)

Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde (CID -10)
• G 70.0 Miastenia gravis

Diagnóstico
História e achados físicos fornecem usualmente as pistas iniciais mais importantes para definição de MG, seguidos pelos exames complementares.

Diagnóstico clínico
Anamnese
Uma história detalhada dos sintomas de fraqueza muscular e de fatigabilidade é imprescindível para o esclarecimento de queixas vagas associadas a MG. É importante inquirir sobre a progressão dos sintomas miastênicos que usualmente afetam os músculos oculares na fase inicial, mas tendem a generalizar-se dentro de 2-3 anos após o diagnóstico.

Anormalidades oculares
Frequentemente há queixa de ptose palpebral, visão borrada ou diplopia, particularmente após uma sessão de leitura ou ao final do dia. O envolvimento da musculatura ocular externa estará presente em 90%-95% dos casos em algum momento da doença. Uma maneira de aumentar a sensibilidade da detecção deste achado é pedir ao paciente que olhe para cima de forma sustentada ou abra e feche ambos os olhos repetidamente. Após a manobra, oftalmoplegia completa e nistagmo também podem ser vistos, embora menos frequentes. Quando a manifestação inicial de uma síndrome miastênica for de origem ocular, a hipótese de síndrome de Eaton-Lambert é virtualmente excluída.

Anormalidades de musculatura bulbar e facial

Um terço dos pacientes apresenta dificuldade de mastigação e deglutição, podendo haver, inclusive, emagrecimento associado. Regurgitação nasal de líquidos ou sólidos pode resultar do acometimento dos músculos faríngeos e palatais. Caso haja fraqueza concomitante da língua, disartria e voz anasalada podem sobrevir. Embora menos frequente, a fraqueza facial pode ser detectada, ao se solicitar aos pacientes que fechem os olhos contra resistência. Eventualmente, podem apresentar um “sorriso canino”, por falência da musculatura do canto da boca e por retração labial.

Envolvimento apendicular
Fraqueza muscular dos membros e do pescoço é encontrada em até 30% dos pacientes, sendo que em apenas 3% o predomínio é distal.

Anormalidades respiratórias
Ocasionalmente os pacientes podem apresentar-se com insuficiência respiratória por fraqueza diafragmática e de músculos respiratórios assessórios, configurando crise miastênica. Uma maneira eficaz de avaliar disfunção respiratória à beira do leito é solicitar aos pacientes que contem em voz alta até 20 após uma inspiração máxima. Caso sejam incapazes de realizar tal tarefa sem interromper para respirar novamente, a capacidade vital forçada pode ser estimada em menos de 1 litro.

Demais partes do exame neurológico
Sensibilidade e reflexos usualmente são normais.
Os pacientes com MG podem ser distribuídos em 4 grupos de acordo com a classificação de Osserman e Genkins, levando em consideração o padrão de fraqueza. Na Tabela 1, estão indicados os grupos e as respectivas prevalências.

Tabela 1 - Classificação de Miastenia Gravis conforme Osserman e Genkins
Grupo 1: Ocular
25% Ptose, diplopia

Grupo 2a: Generalizada leve
35% Envolvimento ocular e de extremidades, sem sinais bulbares proeminentes

Grupo 2b: Generalizada moderada a grave
20% Sinais oculares ou bulbares, envolvimento variável da musculatura apendicular, sem crises

Grupo 3: Aguda fulminante
11% Sinais generalizados com envolvimento bulbar proeminente, com crises

Grupo 4: Grave de instalação tardia
9% Generalizada, sinais bulbares proeminentes, com crises

Diagnóstico laboratorial
Testes laboratoriais confirmatórios são essenciais para o diagnóstico de MG. A ordem de realização é a sugerida a seguir.

Estudo eletroneuromiográfico
Estimulação elétrica repetitiva, realizada durante eletromiografia, é o teste de escolha para avaliação de pacientes com potencial disfunção da junção neuromuscular. É método diagnóstico mais resolutivo dentre os disponíveis para o diagnóstico de MG1, variando a sensibilidade conforme o segmento anatômico e a classe de doença, segundo a classificação de Osserman e Genkins10. A técnica inicial recomendada é a da estimulação repetitiva a 3-4Hz. O teste será positivo (75% de sensibilidade) se houver decremento do potencial de ação muscular composto evocado > 10% quando comparados o primeiro e o quarto ou quinto estímulo. Neuroconduções sensitiva e motora são normais, podendo eventualmente a eletromiografia demonstrar um padrão miopático concomitante. Caso o exame seja normal e ainda permaneça a suspeita diagnóstica, recomenda-se a realização de eletromiografia de fibra única, que apresenta uma sensibilidade de 99%, excluindo virtualmente MG caso sua análise seja normal.

Análise laboratorial
O teste imunológico mais comumente utilizado para o diagnóstico de MG mede a quantidade de anticorpo antirreceptor de Ach marcado por alfa-bungarotoxina (pesquisa de anticorpo antimúsculo estriado). A sensibilidade do teste é de 50% na MG ocular e de 85% na MG generalizada.

Outros exames
Uma vez confirmado o diagnóstico, deve-se investigar a ocorrência concomitante de outras doenças frequentemente associadas a MG. Para tal, recomenda-se a realização de tomografia computadorizada de tórax para investigar aumento de volume do timo e planejar cirurgia se indicada. Hemograma, função renal e hepática, eletrólitos, velocidade de eritrossedimentação, provas de função tireóidea e de atividade reumática são exames necessários para excluir outras doenças.

Diagnóstico diferencial
Doenças que causam fraqueza muscular sistêmica ou de nervos cranianos podem ser confundidas com MG. Síndromes miastênicas congênitas (não confundir com miastenia gravis juvenil ou neonatal transitória) são raras e de natureza não autoimune. MG induzida por fármacos tem sido associada a penicilamina, curare, procainamida, quininas e aminoglicosídios. Lesões intracranianas com efeito de massa ou lesões de tronco encefálico podem causar achados oculares de nervos cranianos que mimetizam a miastenia1. Outras síndromes incluem a síndrome de Lambert-Eaton, tireoideopatias, oftalmoplegia externa progressiva e distrofia oculofaríngea.

Critérios de inclusão
Serão incluídos neste protocolo de tratamento os pacientes que apresentarem 3 dos critérios abaixo, sendo que pelo menos um deles deve ser baseado nos achados/exames complementares (estudo eletroneuromiográfico ou teste imunológico anticorpo antirreceptor de Ach):
• fraqueza adquirida de músculos voluntários, incluindo os inervados por nervos cranianos;
• flutuação e fatigabilidade;
• resposta eletromiográfica com decremento de amplitude do potencial muscular de pelo menos 10% após estimulação repetitiva a 3-4 Hz;
• melhora clínica objetiva após instituição de medicamentos anticolinesterásicos realizada em Serviço
Especializado;
• eletromiografia de fibra única positiva
• concentração de anticorpos antirreceptores de acetilcolina > 1 nM.

Critérios de exclusão
Serão excluídos deste protocolo de tratamento os pacientes que apresentarem:
• outras formas de miastenia que não a MG (ver Diagnóstico Diferencial);
• contraindicações ou efeitos adversos intoleráveis aos medicamentos indicados.

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